Reincidência zero. Esse é o resultado até agora do Partiu Aula na Justiça, projeto pioneiro no país executado no Rio Grande do Sul que busca ressocialização de adolescentes em conflito com a lei por meio da cultura e da educação. Na quinta-feira (14), ocorreu a formatura de oito adolescentes. É a terceira até o momento.
No total, 25 adolescentes já se formaram no projeto. A cada turma são escolhidos dois monitores, que recebem uma bolsa pelo período de um mês para auxiliar nos trabalhos. O Partiu Aula na Justiça tem duração de até dois anos, sendo que ainda restam 81 vagas.
A maioria dos adolescentes que integra o projeto foi flagrado cometendo o ato infracional de tráfico de drogas. Quem já passou pelo Partiu Aula na Justiça teve os currículos encaminhados para a colocação no mercado de trabalho.
O resultado das cinco oficinas que compõem a iniciativa, ministradas pelo rapper Rafael Diogo dos Santos, conhecido como Rafa Rafuagi, foi a composição (letra e música), produção e interpretação pelos próprios adolescentes de uma música gravada em videoclipe, revelado durante a formatura na quinta-feira (14), em cerimônia no Centro Integrado de Atendimento da Criança e do Adolescente (Ciaca).
— Sempre ter a cabeça erguida e bola pra frente.
Esse foi conselho de uma adolescente que havia concluído o projeto numa turma anterior aos novos colegas durante a formatura na quinta-feira. pelo engajamento e dedicação, ela conquistou um posto de monitoria remunerada. Por sugestão de Rafa, ela e outros três monitores fizeram a entrega dos primeiros certificados, como uma homenagem.
— É jovem ajudando jovem, construindo um novo mundo — disse o Rafa.
A mãe de um dos adolescentes que estava se formando no projeto se disse grata a iniciativa.
— Achei muito bonito esse projeto, para incentivar os jovens que eles têm de ter uma ocupação. Que continue para mais jovens ter a oportunidade — disse a mulher, que é moradora do bairro Bom Jesus.
De acordo com ela, a experiência teve reflexos muito positivos no filho:
— Desde que ele começou a vir para cá já tá falando que quer ir trabalhar. Mudou bastante, sabe? Ele nunca foi um guri ruim.
Outro adolescente, que se formou em turma anterior e virou monitor, contou que começou as aulas tímido, mas depois, com atenção e observação, foi se adaptando.
— Experiência top. É só progresso. Levantar a cabeça, não olhar mais para trás e seguir para ter um futuro melhor — resume.
A iniciativa do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ), em parceria com o Ministério Público (MP) e o Ministério Público do Trabalho (MPT), e apoio da Defensoria Pública do Estado, pretende reverter o atual cenário de envolvimento de adolescentes com o tráfico de drogas. Por meio da arte, da cultura e da música, o Partiu Aula na Justiça busca estimular os participantes ao senso crítico e à reflexão sobre os atos praticados.
Em turmas de, em média, 10 jovens, eles participam de quatro encontros no auditório do Centro Integrado de Atendimento da Criança e do Adolescente (Ciaca), em Porto Alegre, e um encontro externo, que acontece em algum ambiente que trate de cultura. Quem aceita participar tem o processo suspenso. Se concluir, poderá ter a extinção da ação. No entanto, se não continuar, o processo segue.
O juiz Charles Maciel Bittencourt, coordenador do Projeto Justiça Instantânea, ressaltou, durante a formatura, que além da importância do aprendizado, o recebimento do certificado significa também a superação de um obstáculo.
— Tiveram um momento lá atrás difícil, mas hoje eles (os adolescentes) estão demostrando que vão sair daqui com um pensamento e uma visão diferentes, e esperamos que estejam sempre com vocês (familiares presentes na cerimônia). Obrigado por virem em um dia tão especial, para eles e para nós. Acreditamos neles — disse o magistrado em sua manifestação na cerimônia de formatura.
O Partiu Aula foi criado por Raffa em 2013 e já atingiu mais de 30 mil jovens e está sendo executado na Justiça pela primeira vez. A iniciativa contribui para mediação de conflitos em escolas públicas. Ou seja, na relação entre educador e educando. Em 2019, ganhou um prêmio da Organização Internacional do Trabalho (OIT).